terça-feira, 13 de novembro de 2012

Entrevista - Artista de Rua

Produzido pelo blog - Artistas de Rua BH


do Uruguai para o mundo

Victoria, 28 anos, filha do meio entre dois irmãos, um policial e o outro músico. Artista de Rua, mãe de dois filhos, um de cinco outro de três anos, casada com Patric, ambos uruguaios e que têm como trabalho a arte dos Malabares.
Encontrei Victoria em um sinal de trânsito no cruzamento da Av. Bias Fortes com a Rua Gonçalves Dias, em Belo Horizonte. Era mais ou menos 18h30min. Victoria, uma bela mulher, alta, rosto com traços finos e delicados, olhos pretos, cabelos curtos e encaracolados estava suada e com a aparência de cansada, mas com um belo sorriso e alegria. Fazia intervenções de arte com Malabarismo de pinos. Fala muito bem a língua portuguesa, porem às vezes se perde nos verbos e mistura gírias com espanhol e sotaque gaúcho, um verdadeiro mix.
Eduardo: Você escolheu a rua para trabalhar ou foi escolhida por ela?
Victoria: Nasci em 1981, na dita liberdade pós-ditadura, no Uruguai. Meus pais não sabiam o que fazer com a tal da liberdade e quando cresci simplesmente escolhi ser livre, trabalhar sem patrões fazer algo que me desse prazer.
Eduardo: Qual prazer você tem trabalhando na rua?
Victoria: A rua me proporciona ter a proximidade com o público. Gosto de quando me ponho à frente dos carros e faço minha apresentação, fico muito feliz quando reconhecem meu trabalho, me aplaudem ou colaboram com algum trocado. Gosto da liberdade da opção que fiz e de poder conhecer muitos lugares diferentes. (risos)
Eduardo: Então já viajou muito? Conhece outras cidades do Brasil? O que esta achando de Belo Horizonte?
Victoria: Sim, já viajei muito. Conheço outros países da America latina, como Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai; no Brasil, venho sempre. Fico um ano e volto para o Uruguai. Gosto de Belo Horizonte, porém, acho as pessoas fechadas, de caras amarradas, acho que o stress da cidade grande não permite que eles se divirtam com minhas apresentações, muitos me olham desconfiados, não estou pedindo esmolas, estou trabalhando.
Eduardo: Você sofre o preconceito por estar trabalhando na rua?
Victoria: Ah! Sim! (risos) Sempre tem aqueles que me vêem com uma garrafa de água na mão e logo dizem “olha lá o combustível dela”. (risos) Acham que é pinga, outros dizem “puxa você é muito bonita, podia estar trabalhando em algum lugar”. Eu penso, que lugar? Uma loja de shopping, um escritório... (risos). Este é meu trabalho, faço por que gosto, por que me dá prazer trabalhar na rua, outros, às vezes me dão um real e dizem “ei, não vai se drogar!” Puxa, se você tem quinhentos reais e paga para ver o show do Rolling Stones, ninguém pergunta ao Mic se ele vai cheirar cocaína com os seus quinhentos reais. Eu pagaria quinhentos reais para ver o show dele e não perguntaria se ele vai cheirar ou comer o dinheiro, porem não tenho...(risos) por que eu tenho que dar satisfação do que vou fazer com meu real? Eu ganhei este dinheiro, estou trabalhando por ele.
Eduardo: E a polícia, incomoda vocês?
Victoria: Às vezes confundem a gente com os nóias (fumadores de crack). Acham que somos marginais ou drogados, ai quando me vêem com meus filhos, pensam que somos moradores de rua, mendigos, sei lá, mas não chegam a nos incomodar. Mas em Blumenau nós fomos proibidos de trabalhar nas ruas , um jornalista “babaca” se vestiu de palhaço ficou uma hora no sinal trabalhando, ganhou alguns trocados e fez uma conta estúpida... Tipo, se trabalhar oito horas por dia, seis dias por semana ganho x vezes este valor... Aí, o ignorante fez a matéria “artista de rua” ganha mais que professor, e trabalhando nos sinais da cidade... É humanamente impossível trabalhar com malabares oito horas por dia, fazer malabarismo exige condicionamento físico e mental.
Eduardo: Até quando você vai ficar em Belo Horizonte?
Victoria: Fico mais três ou quatro dias, aí vou para Goiânia e depois para Mato Grosso, pretendo chegar na Bolívia em julho, vai ter um encontro de malabaristas na cidade de Santa Cruz de La Sierra. Aqui no Brasil e em outros lugares os encontros de malabaristas são focados no esporte e não na arte... Tipo, o cara faz com seis, com oito pinos de olhos vendados. Geralmente filhinhos de papai que buscam somente a consagração no esporte, uma medalha. Diferente de mim, que quero ser reconhecida pelo meu trabalho, quero sempre fazer o melhor, pois acredito que mesmo sendo artista de rua, marginalizada, como as pessoas nos julgam, estou sempre em busca da perfeição do meu trabalho, de fazer o melhor, por que acho que quando se faz o melhor, ganha-se mais, meu trabalho é reconhecido, acho massa quando me apresento no sinal, as pessoas me olham e dizem lá vem outro “nóia” (risos) pedir dinheiro, aí faço truques legais que chamam a atenção e ao mesmo tempo chocam as pessoas, e ouço “porra pensei mal sobre esta mulher...vou lhe dar um trocado”... (risos)
Eduardo: Nestes anos de rua você tem algo engraçado para contar?
Victoria: (risos) Pô, um dia um cara bem vestido em um carrão estranhou meu sotaque portenho e perguntou “de onde você é gata?”... (risos) Respondi que sou do Uruguai e disse de pronto “ah, sim! Fica no Paraguai perto da Paraíba, né?” Péssima cantada... (muitos risos)Pô, o cara nunca viu o mapa da America do Sul... E nem do Brasil. (risos) Mas a falta de informação e educação esta em todo lugar, no Brasil, no Uruguai, acho que talvez por isso algumas pessoas não conseguem enxergar meu trabalho como uma coisa séria, acham que é vadiagem. Eu entendo, porém, na Argentina e no Uruguai, o artista de rua tem mais respeito, é mais valorizado. Estou aqui tentando quebrar estes paradigmas, isso me motiva trabalhar nas ruas do Brasil, mas não suporto a grosseria, uma vez também, um cara perguntou “você faz festas?” e eu disse que sim, que me visto de palhaço com meu marido e fazemos alguns shows para crianças em festas, escolas, clubes... “Ah sim, e outro tipo de festa? Você faz também?”. Cara de pau, achando que por que sou bonita e estou na rua, sou prostituta. Agora já me vou, tenho que encontrar meus filhos, eu estou aqui desde as quatro horas, muito prazer, boa sorte com seu trabalho.

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